sexta-feira, 27 de julho de 2012

Atração dos dias 09/08 e 10/08 - "Sem Conserto" (Lorena Lobato/SP)



“Sem conserto” conta a saga de uma mulher que vai da esperança ao desencanto, à consciência da impotência de “ser” no mundo contemporâneo, que encontra na música a única salvação.  No contexto de uma encenação absurda, serve a metáfora da arte como redenção, como também o fato concreto de que, se a personagem, que nasceu em uma casa sem móveis, apenas com os pianos que o avô consertava, consegue transformar seu único filho em um grande concertista, os tempos de miséria podem estar com os dias contados.

Anna, a personagem, fugiu da Rússia ainda adolescente em decorrência “da guerra” e de um casamento arranjado com um homem de mais idade. A peça não é localizada, se concentra em contar a história dessa mulher que é a de tantas outras, portanto, “da guerra” faz referência a todas as guerras e aos danos psicológicos, morais e pessoais causados por elas. Foi com uma cia de dança, sem saber que destino tomar e só ao chegar à Argentina, percebeu que se tratava de um cabaré, onde teve que trabalhar como prostituta. Após um tempo de percalços vividos na Argentina, retorna à Rússia na esperança de casar com o homem de mais idade do qual fugiu e que agora, poderia resolver seu problema de “estar” no mundo. Mas, grávida não é mais possível casar.

A partir daí, começa a história de Anna e seu filho. O plano e as estratégias que cria, antes mesmo do filho nascer, para transformá-lo num grande pianista. Como as pedintes que estão a cada esquina do espaço urbano, que usam seus filhos dependurados na cintura como meio de sobrevivência, ela, desesperadamente se agarra na convicção de que a música é o único jeito, é a única coisa que pode fazer para que o filho sobreviva e a mantenha viva e bem alimentada. Sob o ponto de vista de quem pára confortavelmente no trânsito e observa o que essas mulheres pedintes são capazes de fazer, Anna também desenvolve uma lógica irracional, constituindo uma rotina para o filho que contraria totalmente as regras de uma educação feliz e saudável, chegando mesmo a crer que a felicidade de que dizem por aí é só uma sensação de felicidade, ...“feliz mesmo é quem consegue tocar a Passionata de Bethoven, a Rapsódia Húngara de Liszt, Villa lobos, Rachmaninoff”...

É considerada louca, perde temporariamente a guarda do filho. E como outros “loucos” da história, de outros tempos, que tiveram outros destinos, como o pai do Bethoven que bêbado batia no filho para ele tocar, ou o de Mendelssohn, o de Erich Korngold que transformaram seus filhos em crianças prodígio, Anna vê na música, não só a possibilidade de viver concretamente neste mundo, mas, a mais contundente e eficaz oportunidade de ser, de sentir e existir para além deste tempo.



Ao longo do monólogo, executado pela atriz, um pianista tocará obras do repertório erudito como Scriabin Estudos Op. 2, n 1, Op. 8, n12; Rachmaninoff, Preludio em sol menor – Op.23, n 5;Liszt – Rapsódia Húngara , n11; Satie - Trois Gymnopédies. São obras que, mesmo aos  não amantes do estilo, difícil é sair ileso ao ouví-las ao vivo em função do virtuosismo e da grandeza dessas criações.

A escolha dessas obras e do tipo de pianista, virtuoso e carismático, é para que o público compreenda sensorialmente essa mulher, fazendo da música esse canal, por onde o público  percorre e embarca nas lembranças e questões a personagem.

Apesar de pessoal, a experiência com música, em geral é significativa, por isso Anna  mostra o filho tocando, para sensibilizar o público e atingir o seu objetivo, dinheiro. Através só do discurso,  talvez ela não fosse tão bem sucedida.



Atores: Daniel Grajew e Lorena Lobato
Texto/Argumento: Lorena Lobato

Lorena Lobato tem formação em artes cênicas, música e dança. 
Daniel Grajew é músico, arranjador e compositor


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