sexta-feira, 17 de agosto de 2012

A experiência do desencontro


Wellington Duarte em Ocorrências / foto: Silvia Machado

Exercício crítico por Karyna Bühler de Mello
 
“Mas esses pensamentos não são de nenhum modo uma formalidade ou tampouco vêm de um provável. Não são simples. Eles desenham por si o seu próprio sentido, se fazem para agilizar um movimento no próprio pensamento. Um movimento por fora do pensado, na direção de um pensamento outro, que age mesmo quando não parece agindo”. Esse trecho escrito pelo paraense Nilson Oliveira, editor da revista Polichinello, ao falar da obra do escritor e ensaísta francês Maurice Blanchot, é capaz de transmitir um pouco daquilo que vimos em Ocorrências, dirigida pelo dramaturgo Luiz Päetow na Mostra de Teatro Contemporâneo.

A falta de harmonia entre luz, ação e música que a princípio causa um estranhamento, com o tempo permite ao espectador uma relação com a própria proposta artística da peça. O bailarino Wellington Duarte se coloca em palco para expressar, por meio do corpo, seu próprio modo de sentir o mundo, como o mesmo declara. A desarmonia presente em palco permite essa construção por parte do espectador.

O público entra em um teatro em completa desordem, cada espectador deve pegar uma cadeira e escolher um lugar. O que em principio parece simples, já se complica nesse instante, em que as escolhas de cada um permitem olhares diferentes sobre aquilo que se encena em palco, os jogos de luzes e sombras horas privilegiam uns ora outros. Esse jogo com o público, ainda acontece em outros momentos, em que a escuridão e o vazio acabam causando desconforto ao espectador, que esboça reações diferentes no decorrer da peça.

A intensa a quebra das expectativas geradas ao longo da apresentação. Por exemplo, quando o som, em sua ausência, salvo pelos chiados, para, mas o dançarino continua rodando em cena. Ou quando o dançarino para diante da plateia, como se fosse dirigir-se a ela, mas, nesse momento, a luz é que se apaga ressaltando a ausência desse corpo sempre em movimento, ocasionando no espectador um vazio e uma falta de sentido que é explicado no todo da peça.

Ao mesmo tempo, em meio a essas dissonâncias, observamos a busca de um encontro com a sua própria ausência. Sobretudo quando o dançarino se coloca a “dialogar” com a sua própria sombra, na busca de juntar-se a ela.

Todas essas ocorrências em palco causam a descontinuidade que instaura o ritmo da peça e são impregnadas pelas experiências artísticas que se desenvolve por meio da construção de pensamento presente em cena.

Karyna Bühler de Mello é graduanda do curso de Letras pela Universidade Estadual de Maringá (UEM) e integrante do grupo de pesquisa Crítica Literária Materialista.

(Texto escrito como exercício da oficina Cultura da Crítica, no âmbito da Mostra de Teatro Contemporâneo. Não possui caráter valorativo). 

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