sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Dissonâncias com causa e (pouco) efeito


A atriz Nathália Corrêa em Balaio / Rafael Saes


Exercício crítico por Alessandra Sardeto 

A peça Balaio, do grupo Balaio, de São Paulo, é composta de três cenas: O pai, A quadratura do círculo e Para narizes bem preparados. A primeira delas, encenada por Cristiano Salomão, Isabel Wilker e Mariana Delfini, trata do relacionamento “pai e filho”; a segunda, interpretada por Stella Prata e Carolina Sudati, abarca a posição radical de uma artista de circo sobre o mundo; a última delas, vivida por Camila Turim e Nathália Corrêa, é uma tentativa de atingir o público para mostrar a ele, e ao artista, o quanto é difícil encontrar uma expressão sincera e que transmita o necessário.

Promovidos pelo CPT (Centro de Pesquisa Teatral), coordenado por Antunes Filho, os fragmentos representam a busca estética por um novo fazer teatral, e talvez por isso seja desconhecidos e pouco acessíveis ao público em geral, comum, impossibilitando o reconhecimento (passagem do desconhecido para o conhecido) por parte deste.

Impossível saber se as buscas por novas formas e movimentos estéticos terão sempre resultados positivos para a criação do espetáculo. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades e formas, enquanto isso não se pode desconsiderar a recepção do material exposto ao espectador. Durante a apresentação, a impressão fixada foi a de que o teatro contemporâneo, com narrativa fragmentada, não linear, almejante do sentir, com poucos diálogos, pouca cenografia, é concebido para uma intelectualidade à parte (um mito justificável neste caso). Criou-se uma atmosfera de “bom-gosto”, ruptura e obrigação que não atinge o público em geral e nem corresponde à suas expectativas. Nunca foi tão difícil ler as entrelinhas da teatralidade. É uma injeção pouco efetiva.

É notável a linha tênue entre a busca por uma nova estética, a incompreensão do conteúdo e a desconexão com o público. Balaio faz pensar no modo de realizar teatro. A experimentação, esse laboratório constante do fazer teatral, é duvidosa pois ao mesmo tempo em que pode acarretar elementos cênicos comunicáveis, não impede uma criação inacessível e dissonante do tempo artístico, histórico, social e cultural da maioria.

Balaio permite indagações: “Qual é o limite para romper a forma? Estaremos sempre rompendo, buscando com qual finalidade? Quem irá ser atingido por essa estética? Rompe-se a forma, e o conteúdo fica à deriva, ou também é claramente propagado e compreendido?”. Apesar da globalização, vivemos em tempos de lacunas, ausências, fragmentações, sejam individuais ou sociais. Não cabe ao teatro aumentá-las.

Em Para narizes bem preparados, corações de galinhas são agregados à cena. A atriz costura-os a fim de tecer um colar, que depois é pendurado em seu pescoço. Sutilmente, o sangue da carne percorre o corpo da mulher. Em outro momento ela pisa veemente na carne do animal, provocando as sensações (desagradáveis ou apáticas) da platéia. A idéia em si é plausível, mas talvez provocasse mais efeito só como escultura, gravura ou colagem, e não como instrumento cênico. O uso de órgãos, ou mesmo de um peixe (literalmente) fora do aquário tornam-se desnecessários para provocar reflexão, reação ou sensações do público, já que há linguagens e elementos cênicos que dialogam e se conectam melhor com ele e com o espetáculo.

Alessandra Sardeto é graduanda do curso de Letras e Literaturas correspondentes, pela Universidade Estadual de Maringá.

(Texto escrito como exercício da oficina Cultura da Crítica, no âmbito da Mostra de Teatro Contemporâneo. Não possui caráter valorativo).
 

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