segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Um concerto sem conserto

Lorena Lobato em Sem conserto / foto: Rafael Saes

Exercício crítico por Karla Morelli

É num misto de antíteses (alegrias e tristezas, clareza e escuridão, sucesso e derrota) que Anna, protagonista interpretada por Lorena Lobato, conta todo o seu percurso de vida.

O quase monólogo Sem conserto é a história de uma mãe que faz de tudo para que o filho, interpretado por Daniel Grajew, se torne um pianista de sucesso. Devido à exigência e educação, o garoto se torna só e vive para o piano, assim como a mãe tanto idealizava. Dessa forma, o “pequeno” pianista não tem acesso à escola, às brincadeiras, a amigos, enfim à vida em sociedade. A peça é toda desconstruída, há momentos de extrema alegria e outros de melancolia total; também há momentos trágicos e cômicos.

O cenário do monólogo apresenta somente um piano, mas conforme Anna conta seus relatos é possível visualizar mentalmente vários cenários e lugares que a protagonista passou em sua experiência de vida.

A peça começa e termina com a fala de Anna em tape, e no “recheio” a russa começa a narrar a sua própria história. Há momentos em que a protagonista fala de atualidades e depois, do passado, retornando aos momentos atuais: a narrativa segue num vai e vem.

Pelo fato de só pensar em piano, na sua vida e na relação com o piano, a russa é dada como louca e julga os tempos modernos: “Beethoven só se tornou um gênio porque naquela época não existia assistente social!”. Com a ideia de que só os loucos alcançam a glória, a mulher se desprende dos conceitos considerados “normais” para que assim consiga concretizar o seu objetivo que é o de tornar o filho um pianista de sucesso.

O espetáculo ganha amplitudes através da iluminação, do som do piano, das falas de Anna e das expressões corporais apresentadas. Sua forma é simples e sem muitos recursos visuais. A atriz Lorena Lobato representa muito bem a russa e faz com que todos entendam a mensagem mesmo sendo transmitida com o sotaque da língua materna da protagonista. A interpretação convence tanto que dá margem para o espectador pensar se a atriz tem esse sotaque mesmo. A personagem faz com que a sua história e a apresentação do filho ao piano lhe renda uma remuneração ao fim da peça, isso se dá intencionalmente, mas discretamente, fazendo com que o espectador colabore com qualquer quantia sem ser imposto a isso.

O ápice do espetáculo se dá quando a mãe retira uma das partes do piano enquanto o menino o toca. Nota-se que as entranhas do instrumento estão expostas e como estas reagem ao serem tocadas pelo pequeno pianista.

Pode-se dizer que a peça como um todo é um concerto sem conserto. Dessa forma, tem-se que é através de fazer com que o filho se torne um pianista de sucesso que a mãe o desconserta enquanto ser social.


Karla Morelli é aluna não-regular de mestrado em letras na UEM e pós-graduanda em Arte e Educação pelo Instituto Paranaense de Ensino (IPE). Integrante e pesquisadora da Cia. Manipulando Teatro de Animações.

(Texto escrito como exercício da oficina Cultura da Crítica, no âmbito da Mostra de Teatro Contemporâneo. Não possui caráter valorativo).

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